Dr. Alysson Muotri |
De forma simplista, as síndromes do espectro autista revelam comportamentos comuns: a dificuldade no relacionamento social, na linguagem e movimentos repetitivos. O termo “espectro” sugere justamente que esses comportamentos são extremamente variáveis de pessoa para pessoa. O fato de ser uma síndrome que começa relativamente cedo, durante o desenvolvimento infantil, traz conseqüências sérias para paciente, familiares e estado.
O autismo é um espectro de síndromes com forte contribuição genética e hereditária. Afeta cerca de uma em cada cem crianças nos EUA e provavelmente uma incidência semelhante no mundo todo. Uma incidência bem mais alta que a maioria das outras síndromes infantis. A genética do autismo é complicada e já foram descrito cerca de 300 genes envolvidos com o espectro. Existem casos mais simples, causados por mutações em apenas um gene, responsável pela regulação de outros genes em uma cascata molecular. Mas esses são casos mais raros, em geral, mais agressivos. Na maioria dos pacientes, são mais de um os genes afetados.
Além disso, soma-se a contribuição das mutações esporádicas, que acontecem o tempo todo e em todos os indivíduos, mas pode fazer a diferença naqueles que já possuem predisposição. Modelos matemáticos, baseados em dados da literatura, estimam que haja uma interação de entre três e dez genes, afetando de duas a três vias metabólicas importantes para o desenvolvimento cerebral. Fica difícil de identificar a forma que como o autismo é transmitido hereditariamente e é praticamente impossível de se conseguir um método de diagnóstico genético com as técnicas atuais.
Esse cenário complexo e confuso dá oportunidade à “razão emocional”. Vacinas, preservativos, falta de amor ou qualquer outro fator são acusados de estarem associados ao autismo. Levam-se anos para desmistificar algumas dessas associações precipitadas, perdendo verbas que poderiam servir para projetos científicos mais fundamentados.
O que pode ser feito para ajudar? A conscientização é o primeiro passo. Organizações de pais são muito importantes para manter a pesquisa viva. Nos EUA, diversas associações de pais e pacientes participam na arrecadação de fundos para a pesquisa. Pode parecer pouco, mas se conseguirmos pagar o salário de mais um pesquisador na área por um ano, a pesquisa acelera de forma significativa. No Brasil, destaco a Revista Autismo (http://revistaautismo.com.br/) que, embora jovem, já causa um impacto na comunidade brasileira e internacional.
A boa notícia é que o autismo não é neurodegenerativo, ou seja, não existe “perda” de neurônios com o tempo. Na verdade, crianças que são diagnosticas cedo e entram num programa de tratamento e estímulos têm mais chances de se recuperar. Essa reação do cérebro faz parte do fenômeno de plasticidade neuronal. Da mesma forma que acontece nos pacientes, neurônios derivados de crianças afetadas possuem o potencial de reverter esse “estado autista”, comportando-se como se fossem neurônios sadios. Medicamentos que possam acelerar o processo estão sendo pesquisados e as perspectivas são positivas. Existe razão para manter o otimismo alto.
Dr. Alysson Muotri é biólogo molecular formado pela Unicamp com doutorado em genética pela USP. Fez pós-doutoramento em neurociência e células-tronco no Instituto Salk de pesquisas biológicas (EUA). Hoje é professor da faculdade de medicina da Universidade da Califórnia.
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