quarta-feira, junho 08, 2011

Diretores e atores debatem repercussão de piadas de mau gosto na internet

Redação do
DIARIODEPERNAMBUCO.COM.BR
08/06/2011

Rafinha Bastos foi considerado pelo jornal The New York Times o homem mais influente do mundo no Twitter, com seus mais de 2 milhões de seguidores, que replicam suas mensagens sem parar. É apresentador de TV e lota teatros. No seu repertório, a seguinte piada: “Toda mulher que vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia. Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso para você não foi um crime e sim uma oportunidade. O homem que fez isso não merece cadeia, merece um abraço”.

A piada não teve graça para muitas pessoas e foi recriminada por parte do público. Colega de TV de Rafinha, Danilo Gentili também foi infeliz no Twitter. Escreveu: “Entendo os velhos de Higienópolis temerem o metrô. A última vez que eles chegaram perto de um vagão foram parar em Auschwitz". Teve de se desculpar publicamente. Marcelo Adnet, estrela do humor da MTV, foi outra vítima do próprio destempero. Um quadro de seu programa, batizado de “Casa dos autistas”, foi reprimido. O canal se desculpou, isentou Adnet de qualquer responsabilidade e passou a investir em campanhas de educação e conscientização sobre o autismo.

Semana passada, uma ONG entrou na Justiça contra Marcos Mion, acusando-o de homofobia. A piada que ele fez em seu programa na TV, Legendários, dizia que a transexual Nany People vem com surpresinha. A própria artista declarou não ter se incomodado com o chiste. Nesse contexto, surgem muitas perguntas: como criticar sem ofender? Piadas sobre minorias é sempre manifestração de preconceito? Existe limite para o politicamente incorreto? O humor pode tudo? Para conversar sobre o assunto, o Estado de Minas reuniu dois humoristas de stand up, Paloma Santos e Mário Alaska, e o professor, diretor e dramaturgo da Cia Pierrot Lunar, Juarez Guimarães Dias. A seguir alguns trechos do debate.

Humor politicamente incorreto tem limites?

Mário Alaska – Limitar o humor é algo preocupante. Piada preconceituosa é muito perigosa, mas agora também não posso mais fazer uma piada sobre velha? Faço uma brincando com a Suzana Vieira, então significa que estou atacando a autoestima de toda mulher que tem mais de 50 anos e faz chapinha? Não podemos ser tão caretas a esse ponto.

Paloma Santos – Até a gente que trabalha com isso sentiu um certo incômodo com essas piadas, mas aí penso: onde foi parar a liberdade de expressão? Há 20 anos, o Casseta & Planeta tinha um humor muito mais pesado. Por que só agora, depois de tantas conquistas políticas, trabalhistas, feministas e “chatistas”, isso virou pesado?

Juarez Guimarães Dias – Estou cheio do politicamente correto. O problema então é o politicamente correto? Estamos vivendo num mundo em que nada pode. Não pode fumar e quem fuma vira socialmente criminoso. Tudo tem de estar limpinho, organizado, certinho. Criança no carnaval de rua jogando confete é reprimida por sujar a rua. Não sei em prol de quê. Há tempos me pergunto.

Então pode tudo?

Juarez – Preconceito é diferente. Os estereótipos, socialmente, são uma ferramenta de identificação criados para ajudar a própria sociedade a mapear seus tipos. Mas quando incide sobre o estereótipo um preconceito, aí você valoriza um em detrimento do outro.

Mário – No meio da comunicação de massa creio que existem limites a serem respeitados. TV e rádio são concessões, muita gente está ali vendo e ouvindo sem querer. Nos meios de massa, faz parte saber conviver com essas limitações.
Cabe ao humor quebrar as barreiras do preconceito?

Mário – Esse é o pulo do gato. Dentro desse ambiente, com limitações de vocabulário e “pegada”, é que busco algo reacionário, culturalmente chocante e proponho uma questão para a sociedade refletir. Provoco o riso em uma sociedade que tem vergonha. Esse é o desafio do humorista.

Paloma – A sensação que tenho é de que a pessoa que deseja proibir uma piada não quer ouvir a verdade, assimilar uma realidade dura, então exerce a censura. Quando fazemos humor estamos fazendo uma crítica.

Juarez – Devem haver limites e eles dependem do veículo. Mas uma piada com relação ao estupro, num contexto de violência, de agressão física, de alguma forma valoriza o estupro e isso é prejudicial. Dá relevo ao crime. Mas o humor, independentemente de onde esteja, está para ressaltar comportamentos que a própria sociedade oferece. Já era assim na comédia grega: pegavam comportamentos da sociedade e tripudiavam, mas a partir do que a própria sociedade oferecia.

Mário – Fazer humor é andar no fio da navalha entre o preconceituoso e o engraçado; o pesado e o leve; o inteligente e o complicado. Às vezes, temos de ir além do limite para entender onde ele está.
Os fins justificam os meios?

Mário – Se o humor de besteirol, satirizando o homossexual, não é moralmente aceitável ou condenável, por que as pessoas se sujeitam a fazer? E por que tantos vão ver?

Paloma – Esse estereótipo é socialmente assimilado. Se eu fizer piada sobre gorda, tenho a redenção porque sou gorda. As pessoas riem comigo e não de mim. Mas se um magro fizer, vai ser gratuito, só para escrachar.

Juarez – O espectro de imagens difundidas é reduzido demais. Existe uma seleção de estereótipos clássicos difundidos em massa há muito tempo. Privilegiam-se uns em detrimento de outros.
Dá para fazer humor sem incomodar os outros?

Paloma – Meu processo criativo está mais ligado ao que acredito e acho engraçado. Não que meu humor seja mais leve, porque não é. Falo palavrão, falo de sexo. As pessoas não falam o que pensam porque têm um freio social, mas quando estamos no palco e falamos o que todos pensam, ou o público vai rir muito ou resistir. Meu freio é meu bom senso.

Mário – Como fazer sem desagradar a alguém? No stand up você fica nu no palco e aquilo que o incomoda como pessoa, mais dia menos dia você coloca para fora.

Juarez – Tudo virou uma celeuma. Tudo agora é problema. Não pode falar de nada. Não pode fumar, não pode beber, não pode ser gordo, não pode comer sanduíche, não pode fazer piada de judeu.

Qual é o limite? O bom senso?

Mário – Bom senso é uma questão pessoal.

Juarez – Talvez seja o limite entre o leve e algo degradante. A piada do estupro ou do judeu estão no mesmo nível. Uma coisa é satirizar, outra é degradar. Rafinha Bastos e Danilo Gentili são ruins demais. O bom senso pode ser medido pelo “coloque-se no lugar do outro”. Colocar-se no lugar do outro ajuda e é um parâmetro.

O que eles acham de…

CQC -

Juarez – Era interessante no primeiro ano, quando só o Marcelo Tas era conhecido e os outros estavam ali a serviço da notícia e do humor. Agora, a notícia e o humor estão a serviço deles. Eles ficaram maiores que o trabalho deles. Não me interessa mais.

 Mário – Eles têm de ficar muito espertos com essa história de questionar deputado. A ideia é deixar o cara numa situação ruim, mas se esquecem de que estão lidando com caras que melhor falam com a plateia no universo: o político brasileiro, que engana a população inteira do país e é reeleito.

Paloma – Deixa eu defender o CQC. Já trabalhei no Judiciário e sei como é. O programa tem o mérito de mostrar para a juventude que existe um Congresso Nacional e despertar neles a curiosidade. A pessoa tem 16 anos, mas já vota.

Pânico na TV

Paloma – Teve o mérito, no início, de desmitificar as celebridades, que eram inacessíveis. Eles começaram a fazer saidinha de festa, que é o momento de fraqueza das celebridades. Elas estão alcoolizadas, sem assessor de imprensa. É um exercício de humanização, de quebrar com essa coisa de ídolo ser semideus. São pessoas normais, que falam bobagens, bebem, fazem xixi. É bom para essa meninada que tatua cara de artista no braço. Mas também tem o lado sombrio, de fazer mulher gostosa de fonte de renda.

Mário – O Chacrinha já fazia isso. Música, mulher bonita e uma plateia. Antes era um rosto bonito, agora é rosto, biquíni, peito de silicone…

Juarez – Os meios de comunicação tomaram consciência de que a grande audiência aceita muita coisa muito fácil. Como é só entretenimento, pode ser qualquer coisa, quem está sentado assiste e não importa se é só um peito siliconado.

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